A era dos CEO ativistas

É uma tendência que está em crescendo nos últimos anos. Muitos CEO de grandes empresas, principalmente nos EUA, começaram a ser chamados de ativistas. Isto porque abandonaram o tradicional posicionamento de low profile, cultivado durante décadas, e surgiram a assumir, publicamente, posição em questões políticas e sociais, muitas vezes sem qualquer ligação direta ao seu mundo de negócios.

Não se sabe muito bem quando este fenómeno começou, mas é possível verificar que os CEO ativistas começaram a ganhar maior mediatismo nos EUA, principalmente após o aparecimento do “furacão Trump” e do seu controverso quotidiano político. Esta é uma das conclusões do estudo liderado pela Harvard Business Review e que pretendeu analisar todo o enquadramento em torno do novo ativismo dos CEO.

É sabido que as grandes empresas desempenham há muito um importante e ativo papel no processo político e legislativo dos EUA. Elas fazem lobby nos corredores e gabinetes do poder, financiam candidatos e comités de ação sobre os mais variados temas, sempre num natural esforço de moldar as políticas públicas aos seus particulares interesses.

Mas o ativismo dos CEO é algo de novo que surge, sinal dos tempos, na era da comunicação global, da pressão das redes sociais, quando o silêncio deixou de ser considerado de ouro. Trump tem ajudado e as suas polémicas leis motivaram que um número crescente de CEO norte-americanos assumissem controvérsias públicas.

Começaram por ser os casos da polémica que envolveu as leis para transexuais na Carolina do Norte, a violência policial no Missouri ou as determinações contra a imigração. Depois, veio a retirada da Casa Branca do acordo climático de Paris, o velado apoio aos supremacistas brancos no conflito em Charlottesville, na Virgínia, ou a decisão da Casa Branca de revogar a lei que protege os filhos dos imigrantes nascidos nos EUA (DACA). Isto só para citar alguns exemplos.

De facto, assim que o presidente anunciou que proibiria a entrada de imigrantes de sete países predominantemente muçulmanos, os CEO de cerca de 100 empresas de tecnologia, como Tim Cook, da Apple; Mark Zuckerberg, do Facebook; ou Bill Gates, fundador da Microsoft, manifestaram-se contra a medida de restrição à imigração. Outro exemplo aconteceu quando o estado da Carolina do Norte legislou a segregação do uso das casas de banho por transsexuais. Dan Schulman, CEO do PayPal, cancelou os planos de abrir um centro global de operações em Charlotte, que teria criado mais de 400 empregos. Muitos de seus pares tomaram decisões parecidas, o que provocou uma perda estimada de 3,7 mil milhões de dólares em investimentos.

Toda esta disrupção política e social provocou reações também algo apaixonadas por parte de muitos responsáveis corporativos de grandes empresas. E Brian Moynihan, CEO do Bank of America, dá uma explicação: “A função de CEO inclui o investimento naquilo que nos parece certo. Não é exatamente ativismo político, mas ações que vão além dos negócios”, disse.

Riscos e vantagens

A mudança está aí e o ativismo dos CEO tem encontrado natural eco nos media. Embora por enquanto um tanto confinado aos EUA, o fenómeno dificilmente deixará de se tornar global e as empresas de comunicação e relações públicas estão a trabalhar com grande empenho no apoio a prestar aos líderes empresariais. Sim, porque este novo posicionamento dos CEO levanta um vasto conjunto de questões ainda sem respostas concludentes. Desde logo, importa saber quais os riscos e as vantagens que tal atitude acarreta para as empresas…

É óbvio que, ao exporem-se publicamente, os CEO pretendem, em última análise, favorecer um clima propício ao desenvolvimento da atividade das suas empresas. O que varia são os argumentos em que assenta a estratégia de comunicação de cada um.

Há quem reivindique um alinhamento com os valores corporativos para justificar determinadas tomadas de posição, como a defesa das minorias, por exemplo; há quem sustente, como Mark Benioff, CEO da Salesforce, que “hoje, os CEO precisam de defender não apenas os seus acionistas, mas também os seus funcionários, clientes, parceiros, a comunidade, o meio ambiente, as escolas – todo o mundo”; mas todos têm consciência de que estamos na era da comunicação e que o silêncio pode ser entendido como uma forma de cobardia ou de incapacidade.

Bastará sublinhar que um recente estudo realizado pelas Weber Shandwick e HRC revelou que a maioria dos millennials, sejam eles funcionários ou clientes, acreditam que os CEO têm a responsabilidade de falar sobre questões políticas e sociais. Mais: defendem que o ativismo do CEO é determinante nas suas decisões de compra.

Embora as suas motivações possam ser diversas, há dois objetivos centrais que a generalidade dos CEO persegue com o seu ativismo: influenciar os stakeholders em matéria de consciência cívica, – seja na defesa dos direitos das pessoas, seja no ataque ao casamento gay -, ou reforçar o poder económico das suas organizações através da pressão pública sobre os legisladores ou decisores políticos.

Onde outrora reinava o silêncio, o lobby de bastidores e a comunicação interna, prevalece agora a posição pública, o tweet, o artigo assinado, a participação em eventos corporativos com divulgação mediática.

Avaliar os resultados

Mas quais são os resultados práticos deste maior ativismo dos CEO? Dado que o fenómeno é recente, ainda não há grandes evidências empíricas sobre a sua influência na opinião pública e, acima de tudo, no desempenho das empresas.

À vista desarmada, tem sido possível detetar reações positivas e negativas às posições públicas de vários CEO. No entanto, a acreditar numa pesquisa realizada pela Weber Shandwick, 40% dos entrevistados disseram que estariam mais abertos a comprar bens de uma empresa se concordassem com as posições do CEO, enquanto 45% disseram que seriam menos propensos a fazer essa aquisição se discordassem da opinião do CEO.

Um estudo sobre esta temática realizado em 2016 pelo Global Strategy Group conclui que as reações às posições públicas dos CEO variam muito consoante a filiação partidária dos destinatários e também em relação ao tema dessas mesmas intervenções: questões económicas como salário mínimo ou licença parental são muito mais consensuais do que questões sociais como o aborto, o controle de armas ou a imigração.

Uma coisa parece certa: o ativismo dos CEO terá vindo para ficar, com a capacidade de cada um para ter impacto e fazer a diferença a ser determinante na construção da sua reputação e no próprio desempenho da empresa.

Daí que os CEO necessitem de uma preparação específica, de um guia de conduta, para se moverem nesta nova realidade. A seleção dos temas, a escolha do melhor momento para a sua abordagem pública, o alinhamento com os stakeholders internos, a resposta às reações provocadas e a avaliação dos resultados alcançados são algumas das questões que se colocam a quem estiver disposto a sair da zona de conforto que o tradicional silêncio e a aversão à exposição mediática proporcionavam.

É a era da comunicação a ditar as regras…